Márcio, é difícil responder essa questão sem entrar no campo da psicologia, mas como um entusiasta, vou me arriscar. Segundo Jung, as pessoas se apresentam à sociedade através da persona, que é um conjunto de qualidades individuais que correspondem às do coletivo, ou seja, se todo mundo gosta de futebol e você também gosta, então essa vai ser uma das características da sua persona. Essa persona é só uma parte do que você é de fato, o que não significa que o seu “eu” (ou prefira o termo “self” - segundo Jung) esteja reprimido, pois quando você está em casa, em um ambiente particular e situação adequada, consegue fazer todas as coisas que gosta sem se preocupar em adequá-las ao contexto social, gozando de sua liberdade como ser individual. Quando temos que passar muito tempo usando nossa persona, ou seja, nossa máscara social, acabamos massacrando nosso individual, e isso vai criando uma certa pressão interna, pois não é possível se desfazer do individual, eliminar o self, assim como não é possível eliminar completamente a persona. O que acontece com muitos artistas é que quando essa pressão estoura, dá vazão a todas as emoções reprimidas, as quais geralmente saem de modo poeticamente exacerbado, exalando sua plenitude artística. São casos excepcionais, como por exemplo os compositores no tempo da ditadura (ou governo militar, como preferir), ou outros artistas da idade média que enfrentavam forte oposição cultural a certos ideais. Exemplos não faltam. Por outro lado, não são somente esses casos em que é possível manifestar nosso “eu”. Pense numa casa na árvore. Certamente você pensou em uma casa de madeira, mas as cores, a textura, arquitetura, ambiente, etc. por mais simples que seja, são uma criação exclusiva da sua mente. Você não é o criador da primeira casa na árvore, mas quando pensa em uma, exerce toda sua criatividade para criar uma que seja exclusivamente sua, conforme o seu gosto. Isso é criatividade e não exige tanto esforço quanto um orgasmo. Aproveitando sua comparação com o coito, penso que a liberação do “eu” não ocorre no orgasmo, mas o próprio ato em si é a sua manifestação, e o orgasmo, um presente. poderia entrar aqui no conceito do sexo tântrico, mas iria desviar o assunto para muito longe e fugir à sua pergunta rsrs. Mas respondendo a seu primeiro questionamento, “Mas tal liberacao acontece em toda criacao? Ou se usar o exemplo da fala, ela acontece em toda fala? Ou se usarmos o exemplo da politica, ela acontece em toda opiniao sobre politica?”, a resposta para todas elas é sim, acontece todas as vezes. Seria muito difícil impedi-la de sair, e ainda que você se policie para não manifestá-lo todas as vezes, ele está sempre lá, o seu “eu”, sua opinião, sua criação, pronta para sair assim que você der uma brecha.