O fotógrafo Cristiano Mascaro fala sobre seu livro mais recente, Feito e Desfeito, publicado pela Editora BEI, em 2007, como primeiro volume da coleção Educação do Olhar. Em entrevista à CULT, o artista e arquiteto nascido em Catanduva, interior de São Paulo, também analisa a produção de “artistas de photoshop” e comenta sobre a ética na fotografia.
CULT: Com os programas de computação que tiram e acrescentam aquilo que não existe de fato, a fotografia ganha ou perde?
Cristiano Mascaro - Ainda é muito cedo para fazermos uma análise precisa. Em todo caso, podemos dizer que do ponto de vista da criação, evidentemente, os avanços tecnológicos sempre serão bem-vindos pois colocam novos desafios e possibilidades diante do artista. Por outro lado, no jornalismo, por exemplo, a ética e o compromisso com a veracidade dos fatos devem falar mais alto. Já houve um caso em que o fotógrafo aumentou a dramaticidade de sua imagem de guerra colocando mais fumaça de bombas na cena. Se o costume vingar, rapidamente passaremos a não acreditar no fotojornalismo. No entanto, tenho uma cisma um tanto masoquista que vale principalmente para o primeiro caso, o da criação: facilidades demais atrapalham. O desafio do artista é o duro embate com seu material e as limitações e as dificuldades que lhe são impostas. O fotógrafo diante do computador operando o photoshop corre o risco de se tornar um daqueles “pianistas” sentado à frente de um daqueles pianos eletrônicos: ele só finge que está tocando ou compondo alguma coisa.
CULT - Qual é a ética da fotografia?
C.M. - Muitos conceitos terão de ser repensados e reavaliados depois do aparecimento da linguagem digital. Diversas coisas antes impensáveis como próprias da fotografia, terão de ser assimiladas. Para o bem e para o mal. No entanto, como tudo na vida, há limites. Se não os levarmos em conta, correremos o risco de criar uma outra coisa que não será mais fotografia tal como a conhecemos. Creio que o respeito e a fidelidade aos princípios básicos da linguagem fotográfica definem sua ética. Mas para não parecer muito ortodoxo, devo frisar que esse respeito deve estar mais presente no fotojornalismo e na fotografia documental. No trabalho autoral, o fotógrafo deve ser livre para criar o que bem entender.
CULT - O que é um fotógrafo de Bienal?
C.M. - Desde o surgimento da fotografia os jovens, até recentemente, é bom frisar, pensavam em se tornar fotógrafos sonhando “ver o mundo”, refletindo a respeito do que tinham diante dos olhos. Não importava o que resultasse de seus trabalhos: fotos jornalísticas, documentais ou autorais. Atualmente, o que se tem visto é o desejo irreprimível dos fotógrafos de serem “artistas de bienal” mesmo que para isso tenham de se dobrar às “tendências” que vêm de fora, principalmente da Alemanha. E os curadores (nem todos) adoram. E o que vemos? Nada além de instalações ou performances fotografadas (normalmente muito mal fotografadas), fotos do banal que nada são além de uma imagem banal, óbvia e sem surpresas (será metalinguagem?) e, quase sempre, ampliadas no maior tamanho possível. É isso aí, infelizmente.
CULT - Descreva o “mundo desfeito e refeito” através do olhar do fotógrafo.
C.M. - Tomei emprestada a expressão “desfeito e refeito” de um ensaio do professor Antonio Candido a respeito da crônica como gênero literário. Para mim ela define perfeitamente o papel do fotógrafo diante do mundo: desconstruí-lo e reconstruí-lo tornando-o mais interessante e surpreendente.