Outro dia num site vi o livro “The Americans” de Robert Frank e realmente algumas fotografias são maravilhosas, mas no geral não gostei do que vi, e ou melhor, não havia entendido o que havia visto.
Pois bem, sabedor de que alguma coisa estava errada comigo, fui pesquisar e achei o texto “A Fotografia de Robert Frank na busca identitária do “American way of life””.
Pois bem depois de ler este texto as fotografias do livro passaram a ter um sentido totalmente novo, pois, ao meu ver o pós 2º guerra o EUA era um país glamoroso [vide filmes que retratavam a época].
Vick Muniz disse que “Passamos a entender a fotografia quando não há pensamos como um produto mais sim como um processo” ----- Neste caso de “The Americans” eu tive que entender o processo que levou Robert a estas fotos para entender a fotografia em si mesmo e admira-las.
Acredito que existam vários tipos de fotografia. As fotografias de Robert Frank como de muitos outros, necessitam muitas vezes de um contexto, mas em outros momentos não haverá necessidade, pois são extremamente fortes e passam a mensagem.
Não, não vejo necessidade de a fotografia ser entendida sob um contexto para ser apreciada, mas sem dúvida existem fotografias que são baseadas em um contexto e que após conhecê-lo a coisa ganha uma nova forma, algo totalmente novo e talvez apreciemos mais as que antes refutávamos.
Claro que faz sentido. Eh o unico sentido que ha. Ate mesmo para fotos puramente comerciais. Uma coisa eh ser influenciado pela image, outra coisa eh entender a imagem.
Me falaram ontem que 1imagem vale mais que mil palavras. Eu respondi que uma imagem so vale mais que mil palavras se o observador souber do contexto ou conceito da imagem.
Tudo na vida e tudo que ha so eh melhor entendido quando entendido seu contexto.
Agora, compreender nao eh sinonimo de apreciar. Mas um pode ajudar o outro.
Ou o contrario, vc pode deixar de apreciar algo apos conhecer o contexto de tal coisa.
Olá, voltando ao tema “The Americans” aproveitando a exposição no IMS São Paulo.
Adorei a exposição e realmente ler sobre Robert Frank e contextualizar a maioria de suas fotografias me fez curtir tremendamente a exposição. Recomendo.
Uma coisa engraçada é que fui com minha esposa na exposição e ela achou a mesma/fotografias bem sem graça e ela ficou me esperando na Paulista quase 2 horas e eu curtindo a exposição.
Pedi para ela traçar um paralelo entre a exposição “The Americans” e a exposição do Henri Cartier-Bresson (que ficou na Fiesp) e ela me disse que as imagens do HCB eram mais fazeis de ser apreciadas e que poucas fotografias do Robert Frank tinham sentido para ela.
Este paralelo me fez pensar no que o Carlos Romanelli escreveu neste artigo:
"Sim, cada um enxerga com os seus olhos, e isso significa dizer que quando olhamos para uma fotografia vemos muito mais do que um simples conjunto de formas, luzes, sombras e cores. Vemos nossas lembranças, nosso passado, nossos anseios, nossos desejos e nossos medos. A visão e o sentimento que temos sempre será influenciado pela nossa experiência de vida.
Ainda que queiramos ser imparciais, técnicos, racionais, nossa subjetividade sempre estará presente no nosso julgamento. Trata-se de um processo inconsciente"
Um livro muito influente no campo da fotografia de arte que eu descobri uns meses atrás e não tenho conseguido parar de pensar a respeito é “The Pond”, do John Gossage. Esse livro é provavelmente o exemplo mais perfeito de uma obra que precisa de muito contexto pra ser compreendida.
Eu recomendo fortemente que dêem uma olhada no livro. Dá pra ver ele aqui, nesse vídeo do YouTube:
Para o espectador comum, esse livro sofre de dois “problemas” enormes: 1) é quase que impossível discernir o significado das fotos, e 2) as fotos são visualmente desinteressantes.
E, ainda assim, esse é um dos livros mais importantes e influentes dos últimos 30 anos de fotografia.
Não existem muitos sites e recursos em português falando sobre o livro, mas pra quem sabe ler inglês eu recomendo ler a respeito das fotografias, ou até assistir vídeos no YouTube com conversas ou entrevistas sobre o livro e o fotógrafo.
A primeira vez que eu vi esse livro, eu odiei. Mas mantive minha mente aberta, li a respeito, ouvi o que outros tinham a falar sobre a obra, e agora eu não consigo parar de ver essas fotos e pensar sobre elas. Eu não quero fazer fotografias assim, e não quero produzir uma narrativa tão obtusa quanto a do John Gossage, mas eu aprecio muito o que ele fez com esse livro. A sutileza das imagens e da narrativa são incríveis.
Muitos fotógrafos tem dificuldade em criar obras e fotos que sejam modestas; normalmente nós queremos fazer imagens incríveis e óbvias, e isso não tem o mesmo impacto de uma imagem mais sutil.
De certa forma, esse livro é similar ao The Americans. O Robert Frank foi bem sutil nas fotos dele. Ele não gritou bem alto “esse livro é sobre racismo, políticos corruptos, consumismo, individualismo, manipulação em massa pela mídia”; ele mostrou tudo isso, mas de forma sutil. Se ele tivesse falado tudo isso literalmente, o livro não teria nenhum apelo.
Mas ainda assim, me surpreende como muitos olham o The Americans e “não entendem” nem uma única coisa sobre as fotos. Entender o livro inteiro é difícil, mas ninguém consegue nem ao menos captar algumas idéias? Isso mostra o quanto a fotografia convencional e as pessoas acostumadas com fotografia convencional só se focam no visual – qualquer coisa além do óbvio eles não conseguem captar.
E também existe o grande problema das pessoas olharem fotos individualmente. O Frank criou The Americans para ser um livro completo, e não 83 fotos avulsas. Ele gastou bastante tempo sequenciando as imagens. Existem sequências brilhantes no livro, tipo a imagem dos dois jovens dentro do carro em movimento, seguido pela imagem dos idosos no ponto de ônibus, seguido pela imagem do carro estacionado coberto com uma lona e finalizando com a foto do corpo coberto no canto da estrada. Se você se concentrar nas fotos individuais você perde a grande sacada da sequência falando sobre individualidade, a obsessão dos americanos por carros e mortalidade. Existem outras sequências incríveis no The Americans, e o livro como um todo é uma enorme sequência poética sobre a identidade cultural dos EUA nos anos 50. Mas tudo isso se perde quando a pessoa se foca em desvendar cada foto individualmente sem prestar atenção no conjunto.
Eu irei ler este livro (não conhecia) para contextualizar e dividirei meus pensamentos a respeito, posteriormente.
Sobre “The Americans” você tem toda a razão, pois, se não me engano Robert Frank fez 22.000 fotografias e só 83 entraram no livro e o sequenciamento é muito importante para entender a sutileza apresentada. Eu não tinha atribuído esta palavra “sutileza” mas faz todo o sentido.
Eu fiz uma oficina no Masp com Mauro Restiffe sobre a exposição “Av. Paulista” e uma das coisas que ele citou foi isso “de que ao montar a exposição a sequencia das fotografias tem que ter uma narrativa” que seja sutil e causa estranheza. (algo assim).
Sobre sua frase:
“Muitos fotógrafos tem dificuldade em criar obras e fotos que sejam modestas; normalmente nós queremos fazer imagens incríveis e óbvias, e isso não tem o mesmo impacto de uma imagem mais sutil”
É o que venho tentando fazer fujir do óbvio, porém, ao mesmo tempo tenho dificuldade de fazer fotos que sejam modestas e a obviedade é realmente muito ruim e difícil de escapar. Garry Winogrand disse algo tipo “se eu vir algo no meu visor que pareça familiar para mim, farei qualquer coisa para mudar isso”.
Na Roma antiga, Cicero dizia que quanto mais um artista sabe como bajulantear os sentios, mais ele se mobilizara em contra tal bajulentacao. Ele diz que o progresso da habilidade conduz para um anceio da aparencia de menos habilidade e maior “honestidade”.
O que ele chama de honestidade eh o que esta sendo chamado aqui de sutil e modesto. Essas palavras Obvio e Sutil/modesto, eh uma maneira simplificada e mais facil de entender algo que na verdade eh mais profundo e dificil de explicar. Mas simples de entender.
Eu sei que muita gente tem alergia a essa palavra espiritual, mas que na verdade significa somente essencia e nao havendo nada de espiritual no sentido religioso ou isoterico, mas se vc ler a obra de Kandinsky chamada “The spiritual in art”, que eh na verdade chamado de o Pai da arte abistrata, ele fala que a realidade na verdade eh invisivel. A subjetividade radical eh essa realidade, e que essa realidade constitui o unico conteudo na arte, e que a arte procura expressar esse conteudo abistrato.
Em outras palavras nao eh diferente do que Platao, a milenar metafisica e a ciencia empirica moderna dizem. O que obtemos pelas nossas impressoes sensoriais nao eh a realidade mas apenas impressoes da realidade (o obvio). Quando se faz algo “obvio”, esta entao dando atencao a impressao (ou distracao) da realidade (desonesto).
A realidade em si nao eh obvia, ela esta atras das impressoes e quanto menos exaltar as impressoes mais facil de fisgar a realidade (essencia). A realiade em si nunca eh exatamente obvia, vc mais sente do que ve (motivo da palavra “espiritual” ser usado). Pense que as cores que vemos, os cheiros que sentimos e a testura do que tocamos sao todas interpretacoes criadas por nosso cerebro e que sem a qual nao reconheceriamos nada pq veriamos o mundo alienigena a nos.
Podemos tambem resumir de outra forma. Arte eh onde ha uma revelacao, a revelacai eh essa realidade que nunca eh obvia. Eh o que eh capaz de atingir alem das aparencias externas e tocar a essencia de algo.
Richardson diz que o Sublime, nao importa onde encontrado, cativa e preenche a alma mesmo que em compania de milhoes de imperfeicoes (impressionismo por exemplo). A mente fica preenchida e satisfeita, nada parece faltar e mesmo se algo parecer faltar tal falta eh logo esquecida. O oporto eh uma obra perfeita em sua aparencia mas sem essencia, sem esse sublime, sem essa realidade que nao eh obivia e que por isso nao se sente na obra, eh desonesto no sentido de buscar distrair nossa atencao com mera “obvias” aparencias.
Essa questao do “obvio” eu vejo tendo duas influencias.
Quanto mais as a pessoa busca mostrar uma habilidade no manuseio ou criacao de algo, a obra assim se torna “obvia”. E se ve muito isso pq a grande maioria das pessoas que praticam fotografia sao apegadas a questao da ferramenta e buscam mostrar tais caracteristicas de suas ferramentas nas fotos. Tambem por causa do anceio em buscar mostrar dominio de alguma habilidade de criacao na obra. O que pessoas tambem gostam de categorizar como superficial, vazio, distrativo, forcado, etc…
Influencia da publicidade que a grande maioria dos fotografos usam como referencia de qualidade. E publicidade eh sobre explicidade e eh nesse sentido vazia, ela eh estritamente sopre o apelo em criar o anceio do observador as aparencias e nao a “essencia”.
Croix, sobre seus comentários eu diria que a palavra espiritual em se tratando da essência faz muito sentido para mim.
Quanto a “realidade vs impressões da realidade” remete a Caverna de Platão e me fez pensar sobre o que o Carlos Moreira fala sobre Don Quixote ser um ancestral do fotográfo, pois, se o mesmo tivesse uma câmera fotográfica, ele iria fotografar o moinho como sê este fosse um gigante, a imagem iria mostrar um moinho mais com o espirito ou essência do gigante. Ele completa dizendo que a fotografia é uma imaginação/abstração não desvairada, mas que deriva do real.
Eu adoro fotografia de rua e quero expressar algo que realmente exprima a essência desta realidade que só eu enxergo, porém, esbarro em 2 pontos: a fotografia tem que ser tecnicamente boa e que me satisfaça como fotografo e seja agradável ao espectador, com força e mova ele através da sutileza e ou que peça uma segunda olhada. Meu grande problema é não saber o que quero mostrar e ou não enxergar e ou não saber exprimir isto de forma composicionalmente agradavel.
“Para mim, a fotografia é uma arte de observação. É sobre encontrar algo interessante em um lugar comum… Eu acho que isso tem pouco a ver com as coisas que você vê e tudo a ver com a maneira como você as vê” – Elliott Erwitt
Concordo com a fotografia de publicidade mais ela entrega a sua proposta e a habilidade técnica extrema realmente poderá barrar a criatividade?
Vangelismm, o contexto o sequenciamento das fotografias me deu uma nova perspectiva sobre a obra. Não que não ouvesse gostado, porém, careciam desta carga adcional. Passei a ser um fã, passando a entender e gostar de todo o livro “The Americans”.
Entendo que Robert Frank mostrou em sua obra uma impressão da realidade e captou a essência do povo americano nos anos 50.
Don Quixote de fato eh uma historia sobre o cavaleiros representando a mentalidade retrograda da corte espanhola, pensando que ainda esta na idade media (vendo dragoes onde nao ha) e nao percebendo a realidade do mundo que esta mudando em sua frente (moinhos de vento na paisagem).
Eu gosto de encarar minha atividade com fotografia como um dialogo, mas nao um dialogo entre eu e o expectador ou um dialogo entre o expectador e a foto. O expectador da foto para mim nao existe na hora de fazer a foto. O dialogo eh entre eu e aquilo que fotografo e nada mais axiste alem de “nos dois”. E chamo de dialogo pq nao eh um monologo daquilo fotografado, onde apenas a coisa se apresenta e eu apenas clico (“isso eh o que eu vi” - passivo), assim como nao eh um monologo meu no sentido do “isso eh o que eu quis mostrar”. Eh um dialogo pq eu nao estou atras de nada tentando mostrar nada, estou apenas observando, sem expectativa de criar algo ou obter algo. Aquilo que eu fotografo quando me chama a atencao eu vejo como “se apresentando” (me chamando), minha observacao eu chamo de “ouvindo com os olhos o que aquilo tem a dizer”, o meu movimento para “apreciar” o que eu vejo em diferente perspectiva, angulo, distancia, composicao e relacao com o que esta em volta, eh a minha resposta ou reacao aquilo que a coisa me diz, os diferentes angulos sao perguntas e respostas de diferentes maneiras. Em resumo, eh um dialogo visual que acontece so ali na hora quando esta apreciando a coisa. Quando se pre formula uma criacao para depois apenas executar a realizacao, nao existe tal dialogo, nao existe tal apreciacao, passa a ser um monologo disconecto da coisa, a foto pode ater ter uma intencional mensagem, mas nao tem voz (magica) sendo apenas um monologo, a foto eh entao apenas o registro da aparencia e a voz que falta seria a realidade por tras das aparencias.
E obviamente, para se “ouvir” o que aquilo que chama atencao, o monologo interno tem que ser interrompido (parar de ouvir a si mesmo). Eh aquilo que sentimos quando estamos compenetrados e hipinotizados em algo que simplesmente nao ficamos prestando atencao em palavras e frases em nossa cabeca, simplesmente com a mente quieta executamos a coisa. Por isso nada de pensamentos como “Que belo”, “que interessante”, “sera que fica bom assim”, “deixa eu ver como fica se eu tentar assim e assado”. Vc nao precisa saber como faz, nao precisa saber como fazer o expectador olhar e sentir sua foto, vc nao precisa ficar te dizendo o que vai fazer e o que esta achando. Vc precisa apenas ouvir e confiar naquolo que ve esta te dizendo (sentir). E apenas observando (ouvindo a coisa comunicar com vc) a coisa te instrui naquilo que ela comunica. E o resultado entao eh um dialogo silencioso que a maioria das pessoas nao vao ouvir ao olhar para a sua foto, por isso nao precisa se preocupar com elas, a sua atencao deve ser apenas com aquilo com o que vc tem seu dialogo.
Eh assim com pintura, com desenhos e ate escrita que expressa palavras. Escritores em geral nao ficam parando para pensar em cada frase que vao escrever ou formulando tudo antes de escrever. Eles simplesmente escrever sem sem pensar, sem se preocupar em formular muito, expressam o que vem ali na hora, e depois que colocou a livre expressao no papel que trabalha os detalhes.
Essa questao do “saber como fazer”, “saber o que mostrar”, “querer x de reacao do expectador”, penso que sao costumes e aproximacao do mundo comercial, em que vc tem que vender, dar prova de sua habilidade, e ter a garantia de uma reacao positiva do cliente. Sao caracteristicas que fazemos para criar produtos, comercializacao e nao arte.
Claro que saber manipular ferramentas, ter conhecimento de tecnicas e desejar que as pessoas gostem do que vc faz sao coisas positivas e que nos inspiram e contribuem. Mas arte mesmo eh algo expontaneo (uma revelacao), o planejamento eh apenas referencia para nos ajudar a colocar a mao na massa ou usar como inspiracao, mas apos a roda ter comecado a andar todo esse motor eh apenas para manter o ritimo, a coisa mesmo vem eh no embalo.
Muito provavelmente, quando Robert Frank comecou a fazer tais fotos, ou quando terminou, ou em ambos os cados, ele nao tinha nada intencional do que eh descrito e mostrado no livro, a coisa simplesmente veio, apareceu.
Penso que essa eh uma das grandes diferencas. No mundo dos produtos, da apreciacao material, do comercial, a criacao vem antes da execucao e a execucao eh apenas uma realizacao que deve ser o mais fiel possivel a criacao. No mundo das arte as criacao surge durante a execucao, ou melhor dizendo, a execucao eh o que faz a criacao, a arte entao na verdade eh a execucao. O antes eh apenas inspiracao. No mundo comercial ou das aparencias, a “arte” eh o produto final (a aparencia).
Para fazer as fotos do The Americans ele recebeu fundos da Fundacao Guggenheim, para a qual ele teve que submeter um projeto. O projeto que ele escreveu eh facilmente encontrado na internet, e mostra que anos antes de publicar o livro ele ja tinha descrito quais fotos queria fazer, sobre o que o projeto seria e ate mesmo que o produto final seria um livro e nao uma exposicao.
Existem tambem documentos pessoais dele mostrando a intencao premeditada em visitar locais especificos no pais antes de embarcar na viagem, como a fabrica da Ford em Detroit, comites politicos, cidades no sul do pais e cidades de operarios e mineiros. Ele tambem planejou tirar fotos de objetos ou situacoes especificas antes de comecar, como jukeboxes, restaurantes, carros, cowboys e bandeiras dos EUA.
Claro que certos eventos durante a viagem dele moldaram o livro de maneiras que ele nao planejou inicialmente. Aparentemente o livro adquiriu um tom critico ao pais quando ele visitou o sul dos EUA e viu a populacao negra segregada, e tambem quando ele estava atravessando uma pequena cidade e foi preso pela policia local que o acusou de ser um comunista e tambem o discriminou pelo simples fato dele ser um imigrante judeu.
Na ciencia existe a mentalidade de se fazer pesquisa “motivada por hipoteses”, ou seja, o cientista soh faz um experimento depois de reunir evidencias, compor uma pergunta e planejar o que vai testar especificamente. Muitos veem a arte como a antitese da ciencia; uma eh pura expiracao e objetivismo, e a outra eh pura inspiracao e subjetivismo. Mas o Robert Frank teve uma ideia, teve uma hipotese premeditada, e ele saiu no mundo para fazer imagens que provem essa visao dele. Eh tipo um cineasta fazendo um filme, onde um roteiro com falas e cenas predeterminadas existem antes da camera rodar. Claro que esse eh um processo fluido e algumas coisas podem mudar, mas a essencia de certos projetos de arte sao definidos antes do artista comecar. Pra mim isso eh arte de verdade, com verdadeira qualidade. Sair por ai tirando fotos aleatorias para depois tentar coloca-las juntas em um grupo coeso nao requer habilidade, requer sorte.
Quando eu falo de expontaneidade eu nao me refiro em sair fazendo coisas a esmo, sem ideia nenhuma do que e para que esta fazendo, e depois tentar dar um sentido do nada a coisa. O que eu me refiro eh que o planejamento eh o motor de ignicao, mas na hora da realizacao o momento eh o que dita (impressoes, experiencias do momento, sentimentos no momento). Motivo pelo qual muitas obras de projetos de arte comeca a partir da realizacao de um trabalho planejado para outros fins, ou deriva de tal.
Eu nao sabia que o livro de Robert Frank foi a base de um projeto apresnetado e financiado para realizar um livro final. Mas mesmo saindo com um tema, local e sabendo o que fotografar, ele planejou como seria a caracteristica, composicao, luz e demais aspectos de cada foto premeditadamente? Ou ele chegou no local e simplesmente fez de acordo com o que o momento inspirava? Ele fez cada foto ja sabendo que aquele clique vai para o livro? Ele fez as fotos com a mente pensando sobre em fazer algo que o expectador olhe mais de 1 vez? Ou ele simplesmente estava ali e so ali e foi fotografando sem ficar pensando em como cada foto vai ficar no livro?
Sobre arte e Ciencia
Eu nao vejo arte como antisete da ciencia. Na verdade eu nao consigo ver arte, ciencia e metafisica de forma separada. Eh tudo a mesma coisa.
Veja esse video de um cientista explicando sobre a realidade simulada (hoje aceito e comprovado pela ciencia):
Note que o que ele fala, da realidade ser abistrata e as formas serem “ilusoes” eh exatamente o que Kandinsky diz em seu livro publicado em 1911, On the Spiritual in Art. E que tambem nao eh muito diferente do que platao ja dizia na Grecia antiga. Se parar para observar, todo o conhecimento metafisico que existe ha milenios, em sua grande parte hoje eh ciencia, comprovado pelos metodos cientificos.
O problema da ciencia eh que ele eh limitada em medicao de materia, tempo e espaco, o que a metafisica ha milenios ja chama de nao existente mas apenas ilusao. Veja que fisicos e matematicos como Einstein e Stephen Hawking so conseguiram fazer suas grandes descobertas cientificas atravez de conceitos extremamente abistratos (metafisica), depois indo atras da explicacao atravez da matematica para comprovar o raciocinio abistrato de acordo com os padroes cientificos.
E nesse video o cientista explica que foi descoberto que a Fisica nao eh sobre massa, materia, tempo e espaco pq tais coisas nao existe. E atualmente a ciencia esta em busca em saber o que de fato eh a Fisica.
O artista entao eh a pessoa que ve e sente que o que ele ve eh uma impressao e por tras dessa impressao tem outra coisa ao qual busca expressar. Motivo pela qual Kandinsky diz que so tem uma forma da arte ser puramente arte, e ela sendo puramente abistrata.
Note as ultimas palavras que o orador fala no video. O que ele esta descrevendo eh pura arte, tal como Kandinsky e Plantao ja dizia.
Religiao…
Indo mais alem, Arte, Religiao e ciencia eh tudo a mesma coisa. Nao essa religiao institucionalizada que leva as narrativas biblicas e representacoes antigas de forma literal. Mas sim o conhecimento milenar religioso que descreve o comportamento do homem e sua relacao e atuacao no mundo de forma que melhor podessem descrever o que nao tinha como ser dito diretamente com palavras.
Enquanto que para os religiosos Jesus eh literalmente o filho de uma divindade com aparencia humana, o que Jesus foi, se fato ele realmente existiu, foi alguem que simplesmente teve experiencias metafisicas e assim transmitia o que sentia e observava por tal compreencao de tal experiencia: https://www.youtube.com/watch?v=jwocywANpfQ&t
Em resumo eh o que Wittgenstein disse, que todo grande pensador e filosofia falam exatamente da mesma coisa, so que essa coisa nao tem como ser descrita ou expressa diretamente por ser abistrato, e por isso eh dito de diferentes formas.
Ele obviamente não planejou todos os mínimos detalhes de cada foto. Ele estava fazendo fotografia documental, e não de estúdio. Ele foi até o local que planejou, tirou umas 30 fotos lá, e selecionou 1 que funcionou para o livro. Ele fez o enquadramento que deu pra fazer na hora, com a luz que o local tinha.
Mas essa mentalidade de pensar nas qualidades do trabalho e nas qualidades do fotógrafo em termos de fotos individuais, como você está fazendo, é a lógica errada para esse trabalho. As fotos individuais são praticamente secundárias no The Americans, é o conjunto delas que importa.
A concepção que o Robert Frank teve, o conjunto, e como ele colocou as fotos juntas é o que importa. Certas frases em um livro são importantes, mas um grande romance não é medido pelas frases individuais que o escritor colocou nas páginas, mas sim pela história que é contada quando as frases são colocadas juntas. Certas cenas em um longa metragem são importantes, mas a qualidade de um filme e o talento do diretor não são medidos pelas cenas individuais, mas sim como o total é apresentado. Muitas fotos no The Americans mostram o talento do Frank, mas muitas fotos são extremamente comuns, com algumas indo contra o que muitos concebem como boa fotografia. O grande lance do The Americans é o conjunto, como um foto flui em relação a próxima, e como o conjunto todo comunica uma idéia que é a maior que a soma das partes.
Eu concordo com vc. Todo livro deve ser feito com uma “narrativa”. Ate revistas e Jornais as paginas sao pensadas e organizadas para que seguem uma logica narrativa, incluindo as paginas publicitarias, e nao jogados textos, imagens e publicidade de forma aleatoria. E nada disso impede que cada pagina, imagem e texto seja pensado e trabalhado individualmente.
Nao eh tao obvio para mim que ele nao tenha planejado foto por foto. Eu tenho um projeto de livro que mistura narrativas de texto e fotos (sendo que as fotos nao sao mera ilustracao mas parte da continuacao da narrativa do texto). E cada foto em cada pagina foi pensada para ser de X maneira. Ou seja, para o livro eu preciso de aproximadamente 20 fotos e cada uma delas sera trabalhada individualmente para eu fazer 1 click para cada uma delas se possivel. Mas todas serao usadas para seguir uma narrativa entre elas, todas ja tendo sua pagina definida no livro. Mas como eu disse, por mais que eu tenha escrito a descricao de como sera cada foto, incluindo luz, local, poses de modelos, angulos, etc (tal como feito para cinema), tudo isso sao apenas motores. O momento da criacao sera aberto para expontaneidade e incorporar as ideias e inspiracoes que aparecerem ali na hora (capiturar a voz do momento, da criacao). Ou contrario de trabalhos em que vc tem que seguir o script de alguem a risca e por isso nao ha tal “voz” do momento no trabalho (o que foi chamado aqui no topico de “obvio”).
Eu tenho 4 livros de fotografia e nenhuma das fotos que estao no livro foi feita pensando em fazer um livro. Mas todos os livros tem uma narrativa ao qual eu organizei as fotos. E nem as foto nos livros sao aleatorias. O meu livro de fotografia de “natureza morta” (still) sao fotos feitas em um periodo de mais de 5 anos de fazes diferentes, mas o sentido, proposito, motivacao e inspiracao de todas as fotos sao basicamente a mesma (corpo, expressao e alma).
Bom, no caso do The Americans (e imagino que qualquer outro trabalho documental) as fotos nao foram pensadas individualmente em todos os minimos detalhes. Talvez isso seja possivel com modelos ou em um estudio, mas nao eh algo que acontece ao se tirar fotos do mundo real. O Robert Frank planejou os locais, objetos e cenas que queria fotografar, e tudo isso esta registrado em cartas e documentos oficiais. Mas planejar exatamente como as fotos sairiam eh algo que ele nao pode controlar, obviamente.
E o ponto principal eh que isso nao importa. o Robert Frank nao se importava com fotos individuais – alias, isso eh algo que ele disse em correspondencias com outras pessoas, esta registrado oficialmente na historia. Ele disse acreditar em sequencias de imagens, e nao fotos individuais. E olhando as fotos individualmente da pra ver que ele nao se importava com as minucias do enquadramento ou fotometria.
Essa foto no The Americans eh tao incrivelmente sem sentido e feia que ela acaba sendo bonita:
Que diabos de enquadramento eh esse? Ele queria fotografar a mesa e os cartazes, e ele nao centralizou esses elementos, deixando um monte de espaco negativo do lado esquerdo e embaixo da imagem.
Outra imagem que nao faz sentido, cortando o homem quase que pela metade e deixando a foto com uma harmonia desconfortavel:
A razao de todas essas cagadas nas imagens eh em parte porque ele estava fazendo fotos rapidas, na rua, e nao tinha tempo para enquadrar corretamente. Mas na maiorias das vezes o motivo principal eh que ele nao se importava. Fazer fotos bonitas nao importava pra ele. Calcular cada minimo detalhe na fotografia nao importava. Na foto da mesa e dos cartazes ele provavelmente tinha bastante tempo para enquadrar como quisesse, afinal estava fotografando um objeto inanimado em um lugar publico, mas ainda assim ele nao se importou com essas formalidades. O importante pra ele era capturar um momento, e fazer uma foto falar com a outra numa sequencia narrativa que declara a ideia que ele quer passar.
Nesse sentido, o Robert Frank eh o anti-Cartier Bresson. O Bresson queria comunicar uma ideia atraves do momento ideal que soh dura uma fracao de segundo, e captar essa ideia em uma imagem individual perfeita. O Bresson nunca se importou em fazer livros com sequenciamento ou narrativa, essa nao eh a escola de pensamento dele, e da pra ver isso claramente na fotografia dele. Todas as fotografias do Bresson sao incriveis, mas nenhum livro dele tem o mesmo nivel do The Americans. Ja o Frank queria tirar varias fotos, a maioria completamente imperfeita e ruim pelos padroes classicos, e coloca-las em um conjunto que se transformaria em perfeito.
O que vc descreve eh que ele nao fotografa pela foto mas pelo momento. A relacao dele nao eh com a foto mas com o momento. A comunicacao dele nao eh um monologo com a foto mas um dialogo com o momento. Em outras palavras, nao eh registrar um ideal da aparencia fisica para atrair as pessoas com o apelo da tangibilidade material da imagem (distracao), nao eh mostrar o obvio. Mas sim tocar o que esta alem das aparencias fisicas e transmitir a experiencia (dialogo dele) com a essencia da experiencia do momento (chamado aqui de sutileza).
“My film is not a movie. My film is not about Vietnam. [Making it is] what it was really like” - Francis Ford Coppola on [i]Apocalypse Now /i
Eu estou vendo essas duas fotos pela primeira vez e pela descricao que vc deu sobre a relacao de Robert Frank com a fotografia, eu discordo que essas duas imagens nao tenham sentido ou tenham enquadramento feio ou sem sentido.
O que a primeira foto visualmente diz nao eh sobre a mesa. Se a espectativa for em ver a mesa como o tema ou motivo da foto entao nao faz sentido mesmo. A foto eh sobre o ambiente em que a mesa se encontra. O espaco que vc chama de vazio nao eh vazio. Ali eh o horario do dia, o clima, a proximidade da janela e o ambiente.
A segunda foto tambem nao ha nada de errado com o enquadramento. Na verdade eh um enquadramento bem feito que so nao fara sentido se a atencao for feita exclusivamente ao casale ignorando o resto. A vitrine, a linha da passagem de pedestre e talvez ate mesmo o letreiro “Infants wear” pode comunicar algo em relacao com o estilo do casal. Pode ter sido um enquadramento acidental como vc disse, mas eu tenho forte impressao de que nao foi.
Mas minhas fotos de rua sao nesse estilo e meus enquadramentos, por mais que eu tenho poucos segundos para tomar a decisao e fazer a foto, sao sim pensados o tanto quanto possivel. Nao de forma verbalizada dizendo mentalmente “olha isso, vou colocar assim na foto”. Mas simplesmente sentindo o momento com a imagem (o que pode ser chamado de tocar/sentir com os olhos, pq se tentar ver nao vera).
Eh a mesma historia do jogador de basquete que acerta 99% na cesta sem pensar na distancia, forca e posicao exata da cesta, do musico que toca algo perfeito ali criado na hora sem pensar nas notas, do cozinheiro que cria um prato delicioso sem medir ou saber exatamente cada grama de cada ingrediente que usa, e do construtor que cria uma incrivel e bem feita casa sem blue print. E se cada um for explicar como fazem para acertar eles nao sabem dizer, eles apenas dizem que nao pensam muito, apenas vao com o momento.
Boccaccio diz a Giotto que com o seu pincel ele eh “capaz de retratar qualquer coisa criado pela natureza, ate o ponto da decipcao”. E ele diz isso como crotica “a real arte que ha centenas de anos foi enterrada por causa do erro daqueles que pintam para o prazer dos olhos dos ignorantes, do que para a satisfacao do conhecimento dos inteligentes”. Palavras dele.
“Na arte a execução é que faz a criação”. Eu não entendo desta forma. Se considerarmos que Da Vinci fez milhares de sketches de partes do corpo humano para se esmerar nas suas grandes obras em detalhes que chegam a ser espetaculares me leva a crer que o processo de criação se inicia muito antes do ato, seja ele qual for.
Concordo que durante o processo de execução haverá uma criação, porém, como os grandes artistas tem um “assinatura invisível” esta só pode ser expressão de um processo reflexivo ou seja uma consciência da criação.
Sobre seu processo criativo, onde você diz “O expectador da foto para mim não existe na hora de fazer a foto” eu realmente não compreendo, eu isto porque estou tentando me entender neste caso, como você poderá comunicar a sua intencionalidade (seja a beleza da cena, a luz, qualquer coisa) se não se preocupar como o espectador irá apreciar aquela imagem? Talvez exista este dialogo do “como isto será entendido?”, evidentemente se você tiver este interesse.
Eu penso que se digo em qualquer língua “Men yaxshi fotograf bo’lishni xohlayman” eu tenho uma intenção ao expressar isto, porém, o receptor tem que ser capaz de entender.
Bucephalus,
Talvez esta falta de harmonia desconfortável no exemplo da fotografia que você postou seja uma característica da intencionalidade dele para realmente imprimir no trabalho dele este desconforto que ele sentiu com a situação Americana há época