carlos, essa foto me roubou o coração. me perdoem, mas preciso perder uns minutos e deixar algumas palavras sobre ela. afinal, estão aí algumas paixões da minha vida, e o que será de nós se nos privamos de exaltar nossas paixões.
primeiro, exaltar o MART, o movimento artístico tricolor, um coletivo de muitos artistas que faz intervenções urbanas pela cidade e pelo mundo celebrando o único tricolor do mundo (sim, o resto são times de 3 cores, já dizia nelson rodrigues). a foto é no viaduto jardel filho, pertinho da nossa sede. visitem laranjeiras, senhores. é a coisa mais linda da face da Terra. única sede de clube tombada pelo patrimônio histórico nacional.
segundo, exaltar angenor de oliveira, gênio da raça, legenda do Brasil, fundador de mangueira (pra quem não sabe, cartola se inspirou nas cores do seu time de coração para criar o pavilhão verde e rosa). tricolor como todos nós, herdeiros de chico guanabara. foi bonito demais a noite em que lançamos nosso uniforme especial em homenagem a cartola, e a torcida fez um mosaico 3D de uma arte belíssima de um dos grandes do MART e da nossa arte urbana brasileira, o marcelo ment. aquele mosaico foi lindo. poucos dias depois daquele jogo, no mesmo maraca, vivemos o infinito de ganhar uma libertadores em casa, essa honra que só nós temos 
[Torcida do Fluminense faz mosaico 3D em homenagem a Cartola; veja]
Mosaico lançamento 3a camisa CARTOLA
por fim, falar do maior heroi da minha infância, que está representado no meio da foto: ASSIS. essa cabeçada de assis eu vi, criança ainda, com 8 anos, em 1984. foi o gol do segundo título do tri carioca (83, 84 e 85), na final contra o flamengo. esse voo, um rei alado e coroado, nos deu o título às 18:56h daquele domingo (vejam a hora na foto!): fluminense 1, flamengo 0. no ano anterior, assis também fez o gol do título, também em cima do flamengo, no finalzinho do jogo (falo mais disso adiante). por esses e outros gols importantes no nosso rival, assis é conhecido por todos como “o carrasco do flamengo”. ah, quantas vezes na vida cantei: “recordar é viver, ASSIS acabou com você!”… (vejam o hashtag #RecordarÉViver na foto, faz alusão à música). na época ganhar carioca era mais importante que ganhar brasileiro ou libertadores; a molecada hoje acha isso impossível, mas é a pura verdade. e esse time dos anos 80, o time que superou a “era zico”, o time da minha infância, o primeiro time que vi e o time que me fez tricolor pra sempre, fez jogos inesquecíveis nesse tri carioca e no brasileiro de 84. paulo victor, aldo, ricardo gomes, duílio e branco; jandir, delei e romerito; tato, assis e washington. viva eu 500 vidas e jamais os esquecerei.
se me permitem, quero falar mais de assis, quero voltar ao gol do título de 83. vou colar aqui um texto que escrevi em 2002, alguns dias após encontrar pessoalmente assis, meu heroi tão amado. espero que gostem. pra entender a “corrida de assis pra eternidade” a que me refiro no texto, vocês precisam ver como ele comemorou o gol; podem fazê-lo aqui:
Gol de Assis, Fla x Flu 1983
nem vou postar mais foto depois dessa, e meu voto, vocês já sabem de quem é. obrigado, carlos!
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Foi há um mês, numa noite de sexta. Fui com uns amigos a um restaurante aqui em Niterói, onde naquele dia acontecia uma homenagem ao centenário do clube organizada por amigos da FLUNITOR. Já na entrada, a enorme dádiva - na primeira mesa, assim que subi as escadas, avistei o grande ídolo. Eu não supunha, eu sequer imaginaria que seria agraciado com o presente dos deuses em ver ali, em pessoa, uma autêntica bandeira dos meus devaneios de moleque tricolor, camisa 10 do meu time de futebol de botão (rivellino me perdoe, mas te dei a 11), personagem dos meus delírios apaixonados de pequeno torcedor… estava ali à minha frente um herói de glórias que ficarão registradas para sempre na minha memória de menino descobrindo o time do coração, como registrado está na história do futebol brasileiro o título que lhe outorgou o povo, pra todo o sempre: Assis, “o carrasco do Flamengo”.
Era Assis, sentado logo à primeira fila de mesas, próximo da entrada. Fui ao seu encontro com o mesmo coração de criança de quase 20 anos atrás: extasiado, apreensivo, tenso. Larguei tudo e todos que comigo estavam por uns minutos e saudei-o, pedi permissão para com ele me sentar e ter um instante de conversa regada ao néctar da cevada local. Assis me disse que tinha chegado aquele dia mesmo no RJ, ele que mora em Curitiba, e que ficaria uma semana na cidade por ocasião das homenagens do Centenário. E que estava lá no bar, ele também, para ser homenageado.
“Assis, o carrasco do Flamengo”. E convenhamos, não à toa um cidadão pode ser assim chamado de “carrasco” de uma massa do tamanho da rubro-negra. Assis fulminou-os pelo menos 2 vezes, em 1983 e 1984, com dois gols santos, históricos, inesquecíveis, inenarráveis, nos minutos finais de uma e outra decisões de campeonato estadual. Gols que vi no estádio ao lado do meu pai, e que revi, inúmeras vezes; gols que remetem a uma atmosfera de fábula insuspeita.
E não me fiz de rogado - disse ao gênio que quando ele entrou pela lateral esquerda da defesa do Flamengo, depois de um longo passe do Delei, aos 46 minutos da etapa final e enquanto a massa rubro-negra já gritava eufórica do outro lado: “É campeão!” (pois o empate era deles), quando ele ficou cara-a-cara e só rolou a bola mansa, sutil, pro fundo das redes de Raul, eu disse ao Assis que naquele dia eu era um garoto, na arquibancada do Maraca lotado. E disse que acreditava, mesmo sem entender muito de futebol, mesmo sem entender muito de qualquer outra coisa da vida, eu acreditava na vitória, na vitória e no gol do último minuto.
Não sei se algum de vcs já viu a imagem da comemoração do carrasco imortal após esse gol, o gol mais importante de sua vida - ele corre, com as mãos na cabeça, pra lateral e de encontro ao banco tricolor, e não sabe se pára, se pula, se vira cambalhota, se volta, se explode, se sai voando, se acredita, se deixa de acreditar, se chora - ou melhor, chora mesmo, e o choro de Assis com as 2 mãos na cabeça torna a imagem imortal, transforma sua curta corrida em um momento da eternidade. O choro de Assis vale mais que mil títulos, o choro de Assis é um instante único de humanidade no futebol de minha infância e de toda a minha vida.
Pois foi o que eu disse pro velho Assis no "reencontro", dividindo com ele por alguns minutos a mesa, 20 anos depois - disse que naquele dia, quando ele correu pra lateral do campo, pra mim, que era um garoto de 7 anos na arquibancada, que “ele corria mesmo era na minha direção”. E disse que daquele dia em diante, porque Assis e o Fluminense haviam me conquistado pela emoção inesquecível do gol do título no último minuto, eu me dei conta de que não deixaria mais de ser tricolor, nunca mais.
E aquilo assim, dito por mim ao gênio, fez o gênio chorar. E eu, que sou um piegas irremediável, me comovi também. Tb, pudera: o grande herói da minha infância, ficou com os olhos cheios d’água, de novo, tantos anos depois. E quando subiu no palco improvisado pra ser homenageado pelo Dominguinhos do Estácio, lembrou daquele dia, lá no distante 1983, e sorriu pra nossa mesa, e agradeceu a mim, a nós. Os bons sambas de Cartola, Candeia, Paulinho da Viola, Noel Rosa, Ivone Lara, Nelson Cavaquinho, e de todos os mestres da boa música brasileira eram, naquela noite, uma ode para o herói tricolor; até os flamenguistas prestaram a devida reverência ao gênio de sorriso fácil e constante, ao gênio tão, tão humilde. E quando fui embora, recebi do ídolo um agradecimento pela nossa conversa, enquanto eu lhe agradecia por ter me dado tantas alegrias, e mais aquela.
Foi o presente de aniversário que recebi do Fluminense nos 100 anos, eu que também vou fazer aniversário logo. O presente inesquecível pq reencontrei, na figura do carrasco, o pequeno tricolor que fui, vivendo minhas primeiras emoções de ver o Maracanã tão imenso, gigante, lotado… 1983 foi o primeiro campeonato do Flu que eu assisti. 7 anos e já trazia no peito o assombro, a estupefação do espetáculo que é a torcida tricolor em júbilo, que ainda me arrepia da mesma forma, e na mesma intensidade.
Mas o que eu queria mesmo dizer, e não sei se consegui, é que apesar termos vivido recentemente nossa pior fase, meu coração tricolor não se abala - e pelo contrário. Temos a eterna, a perene vocação da vitória. Não preciso lembrar da importância monumental do Fluminense pro esporte e pra cultura brasileiros - tão monumental quanto nossa sede, a “mais bonita do mundo”, a única de clube esportivo tombada pelo Patrimônio Histórico Nacional, construída pelos tricolores para abrigar a primeira competição internacional da seleção brasileira. Laranjeiras e seleção germinaram juntos: foi em nosso estádio que nasceu e se solidificou, pelos pés de Preguinho, Freidenreich e de todos os outros, o mito sobre a grandeza do nosso futebol. Em Laranjeiras, a seleção brasileira NUNCA perdeu um jogo - e foram uns 20 ou 30, se não me engano. Eu poderia lembrar que somos o único clube da América Latina agraciado com a Taça Olímpica, em 1949, pelos serviços prestados aos esportes em geral, e que apenas outros 3 clubes NO MUNDO detém a mesma taça - que geralmente ia para comitês olímpicos, cidades inteiras e organizações nacionais; e lembraria que no dia em que a recebemos, o tal Barão de Coubertain (é assim que se escreve?) declarou estar diante “do melhor clube esportivo do mundo”. Ou poderia, ainda, lembrar que temos mais títulos de futebol e de esportes em geral que todos os outros no Rio de Janeiro.
Ah, eu poderia rememorar tanta, tanta coisa do Fluminense - mas não, hoje eu só queria lembrar, e com tanto orgulho, que meu time é o primeiro grande clube do Brasil a completar 100 anos de futebol. E que se há futebol no Rio de Janeiro, e que se o futebol é uma expressão da alma carioca, ele nasceu ali, no bonito campo das Laranjeiras, onde para cada mero fio de capim da grama que se pisa, o sujeito acaba tropeçando em uma glória enorme de nosso passado.
E que Assis tem um nome gravado pra eternidade nessa história.
Pronto, acabou - e como um e outro pediram, só faltou dizer o parabéns: Parabéns, meu time. E mais cem anos de “três cores que traduzem tradição”. Que Deus nos abençoe, hoje e pra sempre.